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Impacto da pandemia de Covid-19 nas populações de minorias sexuais no Brasil: uma análise das disparidades sociais/raciais na manutenção do distanciamento social e uma descrição do comportamento sexual

Como as medidas de distanciamento social em virtude da pandemia de Covid-19 afetaram indivíduos pertencentes a minorias sexuais e de gênero, além dos mais pobres? Para responder a essa e outras perguntas, Thiago Torres e Brenda Hoagland, ambos do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI-Fiocruz), no Rio de Janeiro, Brasil, e outros pesquisadores*, conduziram um estudo chamado “Disparidades sociais e raciais associadas à impossibilidade de manter distanciamento social durante a pandemia de Covid-19 entre homens cisgênero que fazem sexo com outros homens (HSH) e população transgênero/não binária no Brasil”. O trabalho foi publicado na edição de julho de 2020 em AIDS and Behavior.

Um total 5.490 HSH e pessoas trans/não binárias, maiores de 18 anos, foram recrutadas para o estudo por meio do aplicativo de namoro Hornet, Facebook e WhatsApp, em abril e maio de 2020. Os participantes responderam a questões relativas a dados demográficos, identidade de gênero, orientação sexual, autorrelato de infecção pelo HIV, uso de substâncias químicas e impacto das medidas de distanciamento social. Também foi avaliada a impossibilidade de se manter o distanciamento social por qualquer motivo.

Entre todos os voluntários que acessaram o questionário, 3.486 completaram o seu preenchimento. A média de idade foi de 32 anos, sendo a maioria HSH, com ensino médio ou superior completo e com renda considerada média ou alta. Quase 50% eram não brancos e 23% relataram viver com HIV. Aproximadamente 63% informaram a utilização de álcool. Desses, 30% aumentaram o consumo de bebidas alcoólicas durante o período de distanciamento social. Já entre os que afirmaram utilizar drogas ilícitas (23%), 30% aumentaram o uso das substâncias no mesmo período.

A maioria disse que o distanciamento social havia impactado muito suas vidas (63%) e que sentia medo ou muito medo de contrair Covid-19 (77%). O salário reduzido ou perdido foi o principal desafio relatado pelos entrevistados que realizaram o distanciamento social. Cerca de 25% (917 pessoas) não conseguiram manter o distanciamento social. Após ajustes por idade, identidade de gênero, orientação sexual, região do país e status autorrelatado de HIV, não ser branco, ter menor escolaridade e possuir menor renda aumentaram as chances de não realização do distanciamento social.

De acordo com os autores, as medidas de distanciamento social impostas no Brasil, em virtude da pandemia de Covid-19, contribuíram para aprofundar as desigualdades já existentes no país. Políticas específicas de apoio social e econômico devem ser urgentemente disponibilizadas para as populações mais vulneráveis.

Link para o artigo: https://link.springer.com/article/10.1007/s10461-020-02984-1

*Autores

Thiago Torres (1), Brenda Hoagland (1), Daniel Bezerra (1), A. Garner (2), Kim Geraldo (1), Lucilene Freitas (1), Sandra Wagner Cardoso (1), Emília Jalil (1), Lara Coelho (1), Alessandra Ramos (1), Josias Freitas (1), Marcos Benedetti (1), Cristina Pimenta (3), Beatriz Grinsztejn (1) e Valdiléa Veloso (1).

1 – Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas, Fiocruz, Rio de Janeiro,  Brasil

2 – Hornet INC, Londres, Reino Unido

3 – Ministério da Saúde, Brasília, Brasil