Espaço Trans PrEP, HSH e trans PrEP: tecnologia de prevenção

HPTN 083: resultados do cabotegravir injetável de longa duração entre as participantes travestis e mulheres trans

O HPTN 083 é um estudo randomizado, controlado e duplo-cego ainda em andamento que tem por objetivo avaliar a eficácia da profilaxia pré-exposição (PrEP) ao HIV no formato cabotegravir injetável de longa duração (CAB-LA) em comparação com a modalidade de uso diário oral, com fumarato de tenofovir desoproxila combinado com entricitabina (TDF/FTC). O estudo acontece em 43 locais em sete países (Argentina, Brasil, Peru, EUA, África do Sul, Tailândia e Vietnã) e inclui gays, bissexuais e outros homens que fazem sexo com homens (HSH), travestis e mulheres trans.

Além de avaliar o CAB-LA, o HPTN 083 foi pioneiro por incluir o maior número de travestis e mulheres trans em um estudo clínico de prevenção ao HIV até o momento. Por ser uma população altamente vulnerável ao HIV, conta com desafios extras na avaliação da eficácia da PrEP, como a interação com hormônios de feminização, frequentes episódios de violência física e sexual, e vulnerabilidades socioeconômicas.

Ainda assim, enquanto publicações anteriores divulgaram os resultados gerais do HPTN 083 ou apenas entre HSH, nenhuma havia fornecido dados específicos relativos a travestis e mulheres trans. Para suprir essa lacuna, um artigo conduzido por Mark Marzinke, da Universidade Johns Hopkins, e publicado em novembro de 2023 no periódico The Lancet HIV, buscou descrever as características dessas participantes quanto a aspectos de segurança, eficácia de prevenção, alterações de peso corporal e farmacocinética do CAB-LA durante a fase cega do estudo.

A análise incluiu 570 travestis e mulheres trans que participaram do HPTN 083 de dezembro de 2016 a maio de 2020, com 304 voluntárias do grupo que recebeu TDF/FTC e 266 do grupo que recebeu CAB-LA. Do total de participantes, 330 (58%) informaram fazer uso de hormonioterapia feminizante (estrogênios, progestágenos ou antiandrógenos). Violência íntima por parceiros foi um relato comum ­– 270 (47%) acusaram abuso emocional e 172 (30%) abuso físico. Já 323 (57%) reportaram histórico de abuso sexual durante a infância e 159 (28%) demonstraram ter sintomas de depressão.

Durante a participação no estudo, a incidência de clamídia foi de 20,61%, 16,35% de sífilis e 11,66% de gonorreia. Ocorreram nove soroconversões para o HIV (cinco do grupo TDF/FTC e duas do grupo CAB-LA), relacionadas à não adesão às pílulas da PrEP ou em razão de a infecção ter ocorrido um longo período após a última injeção. O uso de terapia hormonal de afirmação de gênero não resultou em diferenças significativas nas taxas de ganho de peso entre os dois grupos e não demonstrou comprometimento para a eficácia da PrEP.

Assim como em relação a HSH, os resultados do artigo demonstraram que o CAB-LA é seguro e eficaz para prevenir o HIV entre travestis e mulheres trans. No entanto, os dados ressaltaram, também, como a prevenção entre essa população não pode negligenciar as vulnerabilidades sociais, psicológicas e estruturais a que está sujeita, sugerindo a necessidade de serem criadas estratégias para enfrentar tais barreiras.

Link para o artigo: https://www.thelancet.com/journals/lanhiv/article/PIIS2352-3018(23)00200-X/fulltext