PrEP: tecnologia de prevenção

Preditores precoces de soroconversão entre participantes de um programa de PrEP no Brasil, México e Peru – o estudo ImPrEP

O autor principal deste trabalho, Carlos Caceres, e todo o grupo ImPrEP foram agraciados na IAS 2021 com o IAS/MSD Prize for Research in HIV Prevention, oferecido pela International AIDS Society e pela Merck Sharp & Dohme*. O ImPrEP é um projeto coordenado pelo Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas, da Fiocruz, tendo como pesquisadora principal Valdiléa Veloso.

Um dos destaques na programação do ImPrEP na 11ª Conferência sobre a Ciência do HIV (IAS 2021),  promovida virtualmente pela International Aids Society de 18 a 21 de julho, é a apresentação oral “Preditores precoces de soroconversão entre participantes de um programa de PrEP no Brasil, México e Peru – o estudo ImPrEP”, proveniente de análise conduzida por Carlos Cáceres, da Universidade Peruana Cayetano Heredia, e pesquisadores do grupo de estudo ImPrEP*.  

O objetivo foi avaliar o uso, a aceitabilidade e a viabilidade da profilaxia pré-exposição (PrEP) – TDF/FTC em esquema oral diário – no contexto da prevenção combinada do HIV junto a 7.500 gays/outros homens que fazem sexo com homens (HSH), travestis e mulheres trans do projeto. O Brasil iniciou o ImPrEP inscrevendo 3 mil participantes em 14 centros de estudo, o México, o mesmo número de voluntários em seis unidades, e o Peru, 1.500 pessoas em dez serviços.

Em sua apresentação, o pesquisador principal do ImPrEP no Peru afirmou que a  PrEP representa um passo significativo na prevenção do HIV, particularmente entre as populações mais vulneráveis. O fracasso em um programa de PrEP se dá basicamente por dois motivos: em primeiro lugar pela descontinuidade, quando o participante simplesmente deixa de comparecer às visitas programadas; em segundo lugar, pela soroconversão, quando o participante passa a viver com HIV enquanto está no programa. Para aumentar a eficácia, é recomendado que os programas de PrEP sejam capazes de identificar pessoas com maior probabilidade de soroconverter para a oferta de apoio adicional.

Para integrar o ImPrEP, o participante tinha que ser HIV negativo, ter 18 anos ou mais, ter relatado recentemente (nos seis meses anteriores) um dos seguintes comportamentos: sexo anal sem preservativos, parceiro sorodiferente/sorologia desconhecida, diagnóstico/sintomas de infecção sexualmente transmissível (IST) ou sexo transacional. Os participantes elegíveis receberam 30 dias de PrEP com retorno agendado em um mês. As prescrições e visitas subsequentes foram trimestrais, todas incluindo testes de HIV e avaliações comportamentais.

A adesão foi medida pela taxa de posse de medicamentos (MPR), que é o número de comprimidos prescritos dividido pelos dias entre as visitas. Qualquer pessoa que testou HIV positivo pós-inscrição foi retirada do grupo e imediatamente encaminhada para fazer uso da terapia antirretroviral. A regressão de Cox foi usada para identificar os preditores precoces de soroconversão, incluindo dados sociodemográficos de base e comportamentais, sendo a MPR avaliada na visita de um mês.

Até abril de 2021, tinham sido inscritos 4.165 HSH, travestis e mulheres trans no Brasil, 3.360 no México e 2.885 no Peru. Foram constatadas diferenças entre as subamostras dos países no estudo, sendo que a subamostra peruana foi diagnosticada como a mais “vulnerável” por ser composta por maior proporção de jovens de 18 a 24 anos, menor proporção de participantes com mais de 12 anos de escolaridade, maior proporção de mulheres trans e travestis, menor proporção de participantes que foram às unidades em busca de PrEP (em oposição à procura de serviços de testagem e aconselhamento de HIV, por exemplo) e menor proporção em termos de  MPR (≥ 1). Tal configuração é resultado da estrutura e da história social do sistema de saúde do país.

Em termos de soroconversão ao HIV, os três países totalizaram 84 casos (52 no Peru, 19 no Brasil e 13 no México, com destaque para HSH de 18 a 24 anos). Tentou-se identificar fatores que, manifestando-se logo após a inclusão do participante no projeto, pudessem indicar maior risco de soroconversão e necessidade de atenção especial.

Entre os fatores estão a questão da idade (jovem), sexo anal receptivo sem preservativo como a principal fonte de infecção e MPR 0.53-1 (especialmente MPR <0,53) na entrada, podendo funcionar como preditores precoces de baixa adesão à profilaxia. Outro ponto a ser ressaltado é que o Peru apresenta perfis distintos em termos de HSH e população trans que usam PrEP em clínicas públicas de IST. Nenhuma relação foi encontrada com gênero, histórico de IST, motivos ligados às visitas nos centros de estudo ou ser trabalhador do sexo.

O estudo concluiu que a implementação de um programa de PrEP deve prestar atenção direta aos preditores precoces em termos de falhas, como a descontinuidade antecipada e a soroconversão, bem como ofertar apoio adicional àqueles que possam passar por alguma dessas falhas. Os preditores precoces de soroconversão no ImPrEP eram de idade mais jovem, entre 18 e 24 anos, sexo anal sem preservativo e baixa MPR (0,53-1 e <0,53) na entrada. Além disso, o fato de viver/morar no Peru foi um outro fator de risco. Assim, são necessárias estratégias criativas para apoiar os participantes para assegurar a adesão à PrEP e assim evitarem a soroconversão ao HIV.

**Autores do artigo

Carlos, Caceres (1), Kelika Konda (1), Ronaldo Ismério Moreira (2), Igor Leite (3), Geraldo Marcelo Cunha (3), Brenda Hoagland  (2), Juan  Guanira (4), Helen Vermandere (5), Hamid Vega (6), Beatriz Grinsztejn (2), Cristina Pimenta (7) e Valdiléa Veloso (2), do grupo de estudo ImPrEP

(1)Centro de Investigação Interdisciplinar em Sexualidade, Aids e Sociedade/Universidade Peruana Cayetano Heredia-Peru; (2) Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/Fiocruz-Brasil; (3) Escola Nacional de Saúde Pública/Fiocruz-Brasil;  (4) INMENSA-Peru;  (5) Instituto Nacional de Saúde Pública-México; (6) Centro de Pesquisa em Saúde Mental Global/Instituto Nacional de Psiquiatria Ramon de la Fuente Muñiz-México; (7) Ministério da Saúde do Brasil

* O prêmio foi concedido aos melhores trabalhos apresentados na conferência voltados a pesquisas de implementação com foco no desenvolvimento de novas ferramentas de prevenção, novas estratégias e ações de impacto no enfrentamento da epidemia de HIV/Aids no mundo.