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Resultados da fase aberta do estudo IPERGAY a partir do artigo “Eficácia, segurança e efeito no comportamento sexual a partir da PrEP sob demanda para homens que fazem sexo com homens: um estudo de coorte observacional”

Ipergay foi um estudo com a PrEP ocorrido na França e no Canadá entre 2015 e 2016 com homens que fazem sexo com homens e mulheres trans, apesar de estas terem comparecido em bem menor número. A especificidade deste estudo em relação a outros com a PrEP foi o modo como as pílulas de Tenofovir e Emtricitabina (FTC/TDF, também conhecido pela marca Truvada®) foram prescritas, a “PrEP sob demanda”, tal como o método foi batizado. Ao invés da usual recomendação de um comprimido por dia, o IPERGAY testou a eficácia da PrEP restrita apenas aos momentos de atividade sexual. Os voluntários eram instruídos a tomar uma dose de duas pílulas entre 2 e 24 horas antes do sexo, uma terceira pílula 24h após a primeira dose e uma quarta pílula ainda 24h após haver tomado a terceira.

A primeira fase do IPERGAY consistiu em um estudo randomizado, ou seja, em que parte dos voluntários aleatoriamente escolhidos receberam placebo e, a segunda, a combinação de medicamentos da PrEP. Ao final desta primeira etapa do estudo, participantes foram convidados para participar do segundo momento, em que o IPERGAY realizou um estudo de fase aberta, ou seja, todos os participantes recebiam PrEP. O artigo “Eficácia, segurança e efeito no comportamento sexual a partir da PrEP sob demanda para homens que fazem sexo com homens: um estudo de coorte observacional” se propôs a apresentar e analisar dados relativos à fase aberta do IPERGAY.

Os voluntários foram monitorados através de visitas contínuas e previamente agendadas, inicialmente a cada 4 semanas e, a seguir, a cada 8. Antes de cada visita, aspectos como informações socioculturais, comportamento sexual e adesão à PrEP eram investigados através de um questionário. Além disto, os voluntários faziam testes de HIV e outras Infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), além de um exame sanguíneo para testar o nível de Tenofovir no sangue. Este exame é capaz de detectar se as pílulas da PrEP são tomadas 24h, 48h/72h ou uma semana ou mais antes de cada visita. Os voluntários ainda compareciam aos centros de estudo com o frasco de FTC/TDF para que fossem contadas as pílulas e saber com que frequência eram usadas.

Através de todos esses procedimentos, o IPERGAY buscou avaliar, já que prescrita de maneira diferente da usual, em que medida a PrEP sob demanda era eficaz. Também foi analisado possíveis alterações no comportamento sexual dos participantes e na incidência de ISTs.

Com base nessas investigações, a adesão foi classificada em 3 níveis: uso correto da PrEP (pelo menos uma pílula tomada 24h antes do sexo e uma pílula tomada 24h após), nenhum uso da PrEP (nenhuma pílula ingerida 48h antes e depois do sexo) e uso insuficiente [suboptimal use] (qualquer outro uso da PrEP). O número de parceiros e relações sexuais também foi calculado, assim como o número de relações anais sem camisinha – passo importante para se averiguar o quanto o uso da PrEP alterou a rotina sexual dos voluntários.

Dos 361 participantes que iniciaram o IPERGAY, 63 deixaram o estudo antes de seu término. Segundo os autores do artigo, parte disso se explica devido ao fato de a PrEP ter sido aprovada na França e no Canadá em janeiro de 2016. Com isto, o IPERGAY deixou de ser a única fonte de PrEP nestes locais.

Concentrações de Tenofovir foram detectadas em 240 dos participantes, sendo que em 184 (ou seja, 55%) havia indícios de uso da PrEP há menos de 24h. No geral, houve um consumo médio de 18 pílulas para cada participante. Apenas um participante contraiu o HIV durante o estudo. No entanto, os autores do artigo apontam para evidências que mostram que o participante deixou de usar a PrEP no período em que se infectou com o vírus, já que não havia nível consistente de Tenofovir em seu sangue.

A partir dos questionários respondidos antes das visitas, 1382 atividades sexuais ocorridas com os participantes durante o estudo foram monitoradas. Deste número total, a PrEP não foi usada em 359 ocasiões (26%) e usada corretamente em 690 (50%) delas.

Não se notou nos voluntários aumento significativo no número de parceiros sexuais desde o ingresso no IPERGAY. No entanto, o número de relações anais sem camisinha tendeu a aumentar. A incidência de ISTs durante a participação na fase aberta do IPERGAY foi alta, ocorrendo em 156 participantes. No entanto, este número não mudou significativamente em relação à etapa randomizada do estudo.

Estes números mostram uma alta adesão à PrEP na situação de prescrição sob demanda. E apesar de os resultados no IPERGAY não poderem concluir que o uso da PrEP de fato contribuiu para o aumento de relações sem camisinha e ISTs, o fato de usuários da PrEP aderirem à testagem frequente de ISTs faz com que estas possam ser detectadas precocemente e tratadas.

Link para o resumo do artigo: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28747274