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Sou HIV positivo, mas não posso transmitir o vírus graças aos medicamentos

Michael Nugent

Matéria traduzida do site The Guardian com o título original: I´m HIV-positive. But thanks to drugs, no one can catch the virus from me

Me lembrarei pra sempre de como senti no instante em que me avisaram sobre meu diagnóstico positivo para o HIV. Era 4 de julho de 2016 e achei que já era pra mim. Comecei a me achar um risco aos outros e em contagem regressiva para a morte. Não estou sozinho nesta opinião – uma pesquisa recente mostra que quase 40% das pessoas ficariam desconfortáveis em ter um encontro com alguém em tratamento efetivo contra o HIV. E uma em cada três pessoas se sentiria desconfortável dando primeiros socorros a alguém com HIV, mesmo que ele esteja em tratamento.

Agora sei que eu – e todos que acreditam nisso – não poderia estar mais errado.

Há um ano atrás, eu vivia aterrorizado e angustiado pela possibilidade infectar alguém. Conhecer um novo parceiro estava totalmente fora de questão. Cada ação que eu fazia me levava a pensar em todas as possibilidades que poderiam resultar em me machucar. O simples pensamento de ver meu próprio sangue me aterrorizava.

Pensei que meu médico não iria poder me ajudar mais e os dentistas não iriam me tratar; tudo porque eu me sentia andando por aí “infectado”.

Estar com outras pessoas era algo difícil de lidar, especialmente minhas sobrinhas e sobrinhos. Eles sabem que sou uma grande criança e, assim como sempre haviam feito, continuavam correndo até mim querendo brincar, mas eu os afastava dizendo: “Agora não”.

Comecei a fazer muitas pesquisas sobre o HIV e encontrei artigos que mencionavam a palavra “indetectável”. Não era uma cura, mas isso pareceu ser uma luz no fim do túnel: controles efetivos de tratamento do HIV que suprimem o vírus, de modo que os traços do vírus não podem mais ser detectados no sangue.

O recente estudo Partner – que analisou 58 mil casos de sexo sem preservativo entre casais em que um era indetectável e outro HIV-negativo não encontrou nenhuma transmissão do vírus. Zero, de 58.000. Isso prova que se você é soropositivo e tem uma carga viral indetectável, você não é infeccioso e não pode transmitir o vírus. Demorou 20 anos, mas a prova científica está aqui.

Chegar ao “indetectável” se tornou o meu objetivo. Lembro-me do meu primeiro comprimido – havia tanto poder em uma coisa tão pequena. Eu sabia que isso não só salvaria minha vida, mas também protegeria as pessoas que me rodeiam. De repente, senti-me como se tivesse retomado o controle da minha vida. Apenas dois meses após o meu diagnóstico, fui para o meu teste de “carga viral”, para descobrir se o tratamento tinha sido eficaz.

“Tenho boas notícias pra você”, disse o médico. “Os resultados chegaram e eles mostram que sua carga viral não é detectável”.

Recebi naquele momento meu certificado de vida. Fui diretamente pra casa da minha irmã pra mostrar a ela. Dei um enorme abraço em minha sobrinha e sobrinhos e rolei pela sala brincando com eles, tal como sempre fazia antes do meu diagnóstico.

Antes desses resultados, minha família sabia sobre meu status de HIV, e todos tentávamos ser “normais”, mas todos tínhamos nossos próprios medos – aqueles “e se acontecer tal coisa?”. Com esses resultados, era possível sentir a mudança na atmosfera. Houve um alívio.

Ainda estou me acostumando a ser soropositivo, isto não posso mentirAfinal, como um homem gay, meu cérebro havia sido treinado desde jovem para temer o HIV. Agora que sei que não posso transmitir o vírus e estou aproveitando todos os momentos da vida. Mas haverá vários desafios que ainda terei que enfrentar, pois o estigma não desapareceu. As pessoas temem o HIV porque não o entendem. Eu sei muito bem disso, pois eu era uma delas há não muito tempo atrás.

Eu me tornei um orador voluntário em escolas e faculdades, dando palestras sobre como é a vida de alguém com soropositivo. As pessoas dizem que sou corajoso por ser aberto quanto ao meu status, mas esta não deveria ser uma atitude corajosa.

Não sou um risco e não há necessidade de me tratar de forma diferente. Precisamos transmitir esta mensagem às pessoas que vivem com HIV não diagnosticado e não tratado simplesmente porque têm medo de saber. Atualmente, uma em cada sete pessoas que vive com HIV na União Europeia desconhece o próprio status, e, portanto, pode transmitir o vírus. Se nos livrarmos do medo, poderemos deter a epidemia do HIV. É simples assim.

Eu me testei, estou em tratamento efetivo e não posso transmitir o HIV. Esta é minha jornada de diagnóstico para o indetectável. Mas minha jornada para parar o estigma do HIV está apenas começando.

Link da matéria: <https://www.theguardian.com/commentisfree/2017/jun/29/hiv-positive-drugs-nobody-catch-virus?CMP=share_btn_fb>.