2019 Espaço Trans PrEP, HSH e trans

Transcendendo: um estudo de coorte de mulheres transexuais infectadas e não infectadas pelo HIV no Rio de Janeiro

Na maior parte dos países, travestis e mulheres transexuais enfrentram os mais variados cenários de exclusão, especialmente no campo da saúde. No Brasil, essa realidade não é diferente, como demonstra o estudo “Transcendendo: um estudo de coorte de mulheres transexuais infectadas e não infectadas pelo HIV no Rio de Janeiro, Brasil”.

O trabalho traz informações e dados sobre a primeira coorte transespecífica em um país de baixa ou média renda. Publicado em abril de 2019 no periódico científico Transgender Health, 2019, Apr. 5 https://doi.org/10.1089/trgh.2018.0063, o estudo apresenta a coorte Transcendendo de travestis e mulheres trans do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas da Fiocruz e avalia informações das participantes que entraram na coorte entre agosto de 2015 a julho de 2017, com avalição de aspectos de saúde de 322 travestis e mulheres trans com idade mediana de 31,5 anos, 174 (54%) delas infectadas pelo HIV.

Por meio de visitas anuais, foram coletados dados sobre aspectos sociodemográficos, comportamentais, transição de gênero, procedimentos de afirmação, uso de hormônios, discriminação, violência, saúde clínica e mental, prevenção do HIV e cuidados (para aquelas infectadas pelo HIV), além da realização de exames físicos, laboratoriais e medidas antropométricas. A informação de base do Transcendendo reforça o cenário de marginalização e privação em torno das travestis e mulheres trans. A maioria das participantes tinha baixa renda (62% viviam com menos de US$ 10,00/dia), demonstrava um envolvimento muito alto no trabalho sexual (78,6%) e relatava aumento na ocorrência de violência sexual (46,3%) e física (54%).

Outros resultados do estudo mostram que a profilaxia pré-exposição (PrEP) foi utilizada por 18,8% das travestis e mulheres trans não infectadas pelo HIV e que o rastreamento positivo para depressão (57,8%) e uso problemático de tabaco (56,6%), cannabis (28,9%), cocaína (23,8%) e álcool (21,5%) foi elevado. Além disso, quase todas as participantes (94,8%) relataram o uso de hormônios em algum momento, principalmente sem supervisão médica (78,7%). Os resultados descrevem um contexto de exclusão vivenciado por travestis e mulheres trans, expondo vulnerabilidades dessa população em um país de renda média, com pouco acesso a cuidados transespecíficos, prevenção e assistência ao HIV e atenção à saúde mental.

O estudo aponta que abordar as experiências e necessidades da população trans pode ajudar no desenvolvimento de estratégias para diminuir o estigma, melhorar o ambiente dos cuidados de saúde, orientar futuras pesquisas sobre morbidades, uso de hormônios, uso de substâncias e intervenções transespecíficas para apoiar as recomendações relacionadas à saúde. Além disso, contribui para diminuir as lacunas em relação à saúde da população trans e reforça que os cuidados trans não podem ser desvinculados do ambiente social que envolve as travestis e mulheres trans.

Autores do estudo: Ana Cristina Garcia Ferreira, Lara Esteves Coelho, Emilia Moreira Jalil, Paula Mendes Luz, Ruth K. Friedman, Maria Regina C. Guimarães, Rodrigo C. Moreira, Leonardo F. Eksterman, Sandra Wagner Cardoso, Cristiane V. Castro, Monica Derrico, Ronaldo I. Moreira, Biancka Fernandes, Laylla Monteiro, Luciana Kamel, Antonio G. Pacheco, Valdilea G. Veloso e Beatriz Grinsztejn, da Fiocruz