PrEP, HSH e trans

Compreendendo as barreiras e os desafios para a adesão à PrEP: experiências de descontinuidade da profilaxia entre HSH e mulheres trans no Peru: o estudo ImPrEP

O ImPrEP é um estudo de demonstração que, desde 2018, oferece a profilaxia pré-exposição ao HIV (PrEP) oral diária para mais de 2 mil gays/outros homens que fazem sexo com homens (HSH) e mulheres trans em dez serviços de saúde no Peru: nove clínicas públicas e uma clínica privada especializada em infecções sexualmente transmissíveis (IST). O ImPrEP acontece simultaneamente também no Brasil e no México.

No entanto, existem muitas circunstâncias que levam vários participantes a interromper o uso da PrEP. Analisar essa descontinuidade é fundamental para ajustar diferentes aspectos dentro das expectativas de uso entre os participantes do projeto. Esse foi o objetivo central da análise qualitativa “Compreendendo as barreiras e os desafios para a adesão à PrEP: experiências de descontinuidade da profilaxia entre HSH e mulheres trans no Peru: o estudo ImPrEP”, capitaneada por Jean Pierre Jirón Sosa, da Universidade Peruana Cayetano Heredia, e pesquisadores do grupo de estudo ImPrEP*. O trabalho foi  apresentado em forma de pôster na 11ª Conferência sobre a Ciência do HIV (IAS 2021),  promovida virtualmente pela International Aids Society, de 18 a 21 de julho.

Foram realizadas 14 entrevistas individuais em profundidade com ex-participantes do ImPrEP (dez HSH e quatro mulheres trans) de três serviços peruanos, estruturadas em cinco pilares acerca da descontinuidade: razões pessoais, comportamento sexual e práticas de prevenção, revelação do uso para seus pares, interação com o serviços/cuidados de saúde e barreiras estruturais.

Entre os resultados, o fato de os descontinuadores da PrEP terem múltiplos parceiros sexuais (incluindo alguns sorodiferentes) e muitos serem profissionais do sexo com baixa autopercepção de risco de infecção pelo HIV. A PrEP foi apresentada e ofertada a esses participantes quando visitaram o serviço de saúde para se testar em relação ao HIV ou buscar preservativos. Entre a percepção dos usuários, a possibilidade de a profilaxia permitir sexo sem camisinha. Contudo, foram detectados diversos problemas, como a manutenção do esquema diário, a superação dos efeitos colaterais e o desconforto em termos das orientações quanto à prevenção combinada.

Os participantes mostraram preferência pelo uso de preservativo em vez da PrEP, apesar de mencionar que a utilização da camisinha era intermitente, pesando para a escolha a capacidade de o preservativo prevenir não só o HIV, como outras ISTs. O uso da PrEP foi relatado como frequentemente circunstancial, com base na sorologia do parceiro ou na percepção de risco de infecção pelo HIV.

Foram apontadas como barreiras para a aderência à PrEP o relato de seu uso para familiares, amigos e parceiros, o estigma relacionado à profilaxia e a percepção alheia quanto a possível status de HIV. Uma grande barreira estrutural é a capacidade limitada das instalações dos serviços de saúde na entrega da PrEP, especialmente para aqueles que necessitam de um suporte mais personalizado, como acompanhamentos mais frequentes, comunicação mais permanente e horário de visitas flexível. Além disso, a falta de pessoal e a infraestrutura deficiente colocam a confidencialidade do atendimento em risco, expondo os participantes a situações de discriminação em razão de identidade e orientação sexual, especialmente as mulheres trans.

Pelo lado positivo, a maioria dos participantes aponta que os profissionais de saúde desempenham um papel importante na adesão à PrEP, estabelecendo um efetivo canal de comunicação e transmitindo confiança e segurança em termos de informações.

O trabalho conclui que os descontinuadores da profilaxia no ImPrEP Peru o fizeram devido a uma combinação de fatores: percepção de baixo risco de infecção pelo HIV, falta de comprometimento com o uso da PrEP, desconfiança na sua eficácia, dificuldades de adaptação ao esquema cotidiano e falta de vontade de lidar com os efeitos colaterais, entre outros. O estigma relacionado à PrEP também representa barreiras de aceitação e adesão importantes. Além disso, os serviços de saúde devem se adaptar cada vez mais para atender às necessidades das populações vulneráveis.

*Autores do trabalho:

Jean Pierre Jirón Sosa, Kelika Konda, C. Sandoval, G. Calvo e Carlos Caceres, do grupo de estudo ImPrEP, e do Centro de Investigação Interdisciplinar em Sexualidade, Aids e Sociedade/Universidade Peruana Cayetano Heredia-Peru.